quarta-feira, 23 de março de 2011

EDITORIAL - Jornal Cruzeiro do Sul - O que realmente importa

Notícia publicada na edição de 23/03/2011 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 3 do caderno A



Muito do susto causado pela medida pode ser creditado à forma como o assunto apareceu na pauta da Câmara, na forma de um projeto a ser votado em regime de urgência

 
Ao enviar para a Câmara projeto que transfere para a iniciativa privada os serviços de água, esgoto e destinação final de lixo, hoje prestados pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae), o prefeito de Votorantim, Carlos Augusto Pivetta (PT), começou muito mais do que uma discussão semântica sobre o uso correto da palavra privatização.

 
Por sinal, seria mais fácil para Pivetta se a discussão fosse apenas essa. Mesmo o argumento de que concessão (a forma adotada pela Prefeitura para repassar os serviços) não é privatização não evitou uma saraivada de críticas ao prefeito, partidas da oposição na Câmara e de um grupo de cidadãos que começou a se organizar (segundo se informa, sem segundas intenções de caráter político ou partidário) para tentar obstar o projeto.

Seja qual for a definição correta para o que Pivetta pretende fazer, a ideia de transferir os serviços de água e esgoto para o setor privado, por trinta anos, não agradou a todos. E nem poderia ser diferente, pois a participação da iniciativa privada no setor público, durante boa parte das décadas de 1990 e início dos anos 2000, confundiu-se plenamente com o receituário econômico-ideológico defendido com ardor (na época) pelas lideranças do PSDB, e é, ainda hoje, motivo de forte polêmica - semântica, inclusive - entre os diferentes matizes ideológicos, muito embora o PT já a tenha incorporado sob as mais variadas formas e denominações.

A concessão de serviços públicos tem sido largamente utilizada para serviços de transporte e coleta de lixo, e vem crescendo em setores tradicionalmente estatais como a saúde pública. Não deveria causar assombro, diante desses antecedentes, que também os serviços de água pudessem ser operados por empresas privadas, desde que o gerenciamento e as funções de planejar e fixar as tarifas continuassem atrelados ao poder público. Muito do susto causado pela medida pode ser creditado à forma como o assunto apareceu na pauta da Câmara, na forma de um projeto a ser votado em regime de urgência, que não teve o tempo necessário para ser discutido de forma transparente com a comunidade.

Pivetta, segundo afirma, tem bons argumentos para querer que empresas privadas assumam os serviços de abastecimento de água, coleta de esgoto e gerenciamento dos resíduos sólidos. Conforme o prefeito informou ontem, em entrevista coletiva (veja reportagem na página A10), o Saae não vem conseguindo se capitalizar de forma suficiente para fazer frente aos investimentos que a expansão urbana do município, vitaminada pelo surgimento de condomínios que se assemelham a pequenas cidades, estão a exigir do poder público municipal. O ingresso do setor privado poderia assegurar também o ingresso de investimentos no setor, muito embora se saiba de antemão que empresas particulares visam o lucro e não investem vários milhões em qualquer negócio, sem garantias de que terão um bom retorno.

As referências que a opinião pública tem de serviços colocados na órbita da iniciativa privada são muitas e assimétricas. Há serviços muito bons e que ficaram até mais baratos (como a telefonia fixa, cujas linhas custavam pequenas fortunas e hoje praticamente não têm custo); há serviços muito bons, mas que pesam no bolso, como as rodovias paulistas com sua extensa rede de pedágios; e há serviços, como o transporte coletivo, que pesam no bolso e deixam muito a desejar.

Certamente o problema que parte dos votorantinenses enxerga nas concessões desejadas não é de fundo ideológico, porém econômico. Ninguém está preocupado com o nome que se dá à coisa, mas sim com a coisa em si. Não consta que o serviço de água seja ruim e caro em Votorantim. Há, pelo contrário, evidências de que é bom e barato. Caberá a Pivetta convencer seus concidadãos de que essas vantagens não serão perdidas, com o ingresso do setor privado.

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