sexta-feira, 4 de março de 2016

Editorial - Capivaras e carrapatos

Resultado de sua enorme capacidade de adaptação a ambientes adversos e até hostis, as capivaras estão presentes hoje em grandes centros urbanos, desde que estes sejam cortados por cursos d"água e tenham um mínimo de vegetação. Estão presentes em vários rios da região de Sorocaba e até em São Paulo, sendo vistas famílias do roedor nas margens dos rios Pinheiros e Tietê, apesar de toda carga de poluição que esses dois cursos d"água carregam. Esse grande roedor com hábitos aquáticos -- podem pesar até 90 quilos --, que não tem predadores nos ambientes urbanos, pouco ou nada atrapalharia os moradores das áreas onde vivem se não fosse, assim como o cavalo, um dos hospedeiros primários do carrapato-estrela (Amblyomma cajennense), que transmite a bactéria intracelular Rickettsia rickettsii, agente causador da febre maculosa brasileira.

A mais recente consequência da proliferação de capivaras nas margens do rio Sorocaba foi o fechamento por parte da Prefeitura do Clube do Nais e a transferência dos menores que ali eram assistidos para outras unidades. Há dois anos, a parte externa da unidade já havia sido interditada devido à presença de carrapatos. Mas os problemas com esses animais são mais antigos. No final de 2004, a proliferação de capivaras assustou os moradores de um condomínio do Alto da Boa Vista, construído em torno de um lago que acabou tomado pelos animais. Os problemas causados pelos roedores e a ameaça de transmissão de doenças ficou tão séria que depois de um bom tempo uma equipe do zoológico de Sorocaba participou da remoção das capivaras, mas não se sabe o destino dado aos animais. Por conta de ameaça do carrapato-estrela, o Parque Natural Chico Mendes também esteve fechado durante vários meses.

No mês de julho do ano passado, funcionários da Prefeitura de Sorocaba iniciaram a implantação de placas educativas ao longo da margem do rio Sorocaba com o objetivo de informar e orientar a população da possível presença do carrapato-estrela, numa ação conjunta entre a Divisão de Zoonoses da Secretaria da Saúde e a Secretaria do Meio Ambiente (Sema). A Prefeitura de Votorantim também realizou trabalho semelhante de alerta à população e providenciou também um levantamento de campo, feito pelas secretarias da Saúde e do Meio Ambiente daquele município, para identificar a população de capivaras que vive nas margens do rio e que costuma circular pelas ruas da cidade no período noturno.

É evidente que as capivaras não têm culpa dessa confusão toda. Foi o ser humano que ocupou as margens dos rios e lagos, o habitat natural dos roedores, e não o contrário. O homem foi ocupando e destruindo matas ciliares e várzeas ribeirinhas e também foi responsável pelo desaparecimento, em várias regiões do país, dos predadores naturais da capivara, como a onça, o jacaré e a sucuri. Outro predador seria o homem, mas como a capivara é um animal silvestre e protegido, está proibido de caçá-la. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por exemplo, proíbe sua captura ou manejo sem autorização e acompanhamento técnico de órgãos competentes.

As capivaras, ao serem infectadas por carrapatos com a doença, apresentam bacteremia por até três semanas, podendo evoluir ao óbito ou à cura. Durante esse período, os roedores podem disseminar o agente para outros carrapatos que os estiverem parasitando, causando a amplificação da bactéria no ambiente. Os carrapatos podem se alimentar de qualquer hospedeiro, inclusive o homem, transmitindo assim a doença. Mas é importante lembrar que nem todos os carrapatos-estrela são contaminados pela bactéria causadora da febre maculosa. Levantamento da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) registrou 152 mortes em todo o Estado de São Paulo no período que vai de 1985 a 2011, o que dá uma média de seis mortes anuais, um número bastante baixo. Diante dessa realidade, só resta às autoridades realizar um trabalho eficiente de monitoramento das áreas afetadas pelos carrapatos e, em situações extremas, remanejar esses animais para áreas controladas ou criadouros preparados para mantê-los temporariamente isolados.

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