segunda-feira, 31 de maio de 2010

Quando a morte bate à nossa porta

Manoel Peres Sobrinho*
Onde está, ó morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?... Mas graças a Deus que nos dá a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo – 1 Coríntios 15:55-57 NVI.

 
O telefone tocou e a Diomar atendeu. Era a sua sobrinha querendo visitar a mãe que estava na UTI. Depois de acertarem detalhes, eu entrei na história, porque alguém deveria levar as duas ao Hospital Modelo. Na casa do meu cunhado, fiquei sabendo que sua esposa estava muito doente. Que pouca coisa os médicos poderiam fazer por ela. Aí, os planos mudaram, um pouco. Em vez de minha sobrinha, foi uma outra parente junto com seu pai. Mas, eu e a Diomar, insistimos em ir também. Ficaríamos, por ali por perto, como alguém que pode ser necessário pra ajudar em alguma coisa. E assim fizemos. Ao chegar ao Hospital esperamos até a hora da visita. Primeiro, entrou meu cunhado e a sua parente. Eu a Diomar ficamos esperando do lado de fora.

É incrível, como uma situação como essa e, num lugar como esse, aspectos triviais da vida podem tomar proporções inimagináveis. Naquele instante a vida parece ficar mais densa, mais perceptível. Ela flui e se desenvolve em câmara lenta. Quase que nos esmaga a consciência. A realidade de estar vivo, assume uma categoria de milagre, de um espetáculo inusitado. A respiração fica pausada e ofegante; percebe-se cada movimento ao redor, distingue-se bem as formas, as cores, os trejeitos de terceiros e circunstantes. Tudo parece receber uma outra e nova dimensão. É a incrível experiência de ter consciência de si mesmo e da fragilidade e contingência de existir e poder, sem mais nem menos, desaparecer. A existência, passa a ter a fragilidade de um tênue lampejo luminoso.

Com a saida da parente, entrou a Diomar com ele. Eu continuei fora, esperando, pra entrar no expediente religioso. Nessa espera interminável em que os minutos parecem horas, as imagens e movimentos passam a ter significados especiais. Vi uma futura mamãe, com uma barriga enorme, linda, anunciando que tem mais um (a) brasileirinho (a) chegando. Eu percebi: ela estava toda vaidosa e feliz. Também, não era pra menos. U'a mãe, tomando pela mão seu filho, conversava animadamente de coisas triviais e de pouco valor para o mundo dos negócios.

 
Finalmente, entrei, portando Carteira de Ministro e Bíblia na mão e, a pergunta no coração: que fazer numa hora dessas, meu Deus? Fiz o que podia. Li o Salmo 23 de forma que ela ouvisse e, orei. Orei para que o Senhor a libertasse. E, finalmnete, assim se fez. Às 17:45h, do mesmo dia, ela adormeceu. O Senhor havia ouvido a minha oração.

 
No ofício fúnebre, no dia seguinte, falou antes de mim, uma senhorinha católica, que se identificou como Ministra da Esperança. Falou muito bem, palavras de consolo e conforto a toda a família e circunstantes. Acompanhei com muito interesse o seu trabalho, até cantei com ela e suas companheiras a canção cristã Segura na Mão de Deus e Vai. Quando foi a minha vez de falar, pedi ao Rev. Ramon que fizesse uma oração e, em seguida, li João 14 de 1 a 4: Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar. E, quando eu for e vos preparar lugar, voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, estejais vós também. E vós sabeis o caminho para onde eu vou. Nosso Senhor é Deus dos vivos. Por isso, nos convoca à fé; nos infunde segurança; estabelece um companheirismo e, revela-nos o conhecimento de Deus e da natureza do Seu Reino.

Momentos depois, no Cemitério, todos nós observávamos silentes o trabalho dos pedreiros. Um céu azul anil e diáfano, cobria toda aquela tarde de maio, com algumas nuvens brancas a revelar o desejo de Deus quanto a natureza da alma dos seus santos. Junto ao jazigo, uma árvore estendia bondosamente seus galhos, como a proteger aquele lugar do sol inclemente que a tudo vigiava com obsequiosa atenção.

 
A morte é uma inimiga que já foi vencida por Jesus. Mas, há um crédito que precisamos dar a ela. É a sua capacidade de revelar facetas ocultas de nossa personalidade e modo de viver que insistimos ignorar em nossa fugaz existência. De tudo o que ocorreu, aprendemos, que, com Deus ainda há esperança, principalmente conforme as palavras de Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá eternamente – João 11:25-26 NVI. Foi com essa esperança que voltamos para a casa. Helenice um dia voltará a viver plenamente, e, nunca mais haverá necessidade de que alguém lhe enxugue dos olhos alguma lágrima.

 
(*O autor é Pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil e atualmente ministra na Vila Fiori – Sorocaba).

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