Por Fernando Grecco
“Invejo a burrice, porque ela é
eterna...” (Nelson Rodrigues)
Há de se ter expressiva
prudência ao analisar o nível intelectual e o grau de politização da sociedade
brasileira em tempos atuais. Evidentemente, o abandono intelectual que a
população sofreu ao longo de sua existência, com pequena alteração dessa
realidade nos últimos anos, é suficiente para explicar todas as escabrosidades
da vida brasileira. Os vícios, a corrupção, a balbúrdia social e o colapso das
estruturas socioeconômicas do País são o sustentáculo de uma realidade hostil o
suficiente para gerar milhões de alienados políticos e aculturados do sistema.
De um modo claro, exemplificaremos um episódio recente que, sem sombras de
dúvidas, evidencia um baixíssimo grau de politização da nossa sociedade.
Há poucos dias, a internet
noticiou o fato de um jovem ter disponibilizado na rede diversas imagens de sua
namorada em situações libidinosas, gravadas durante a intimidade do referido
casal. Segundo algumas fontes dos diversos sites que noticiaram com entusiasmo
o episódio, o jovem estava desiludido com uma eventual traição praticada pela
sua companheira e, diante disso, teria publicado as imagens como forma de
vingança. Pois bem, o fato em si, além de certamente modificar para sempre a
vida da garota exposta de maneira criminosa, ajuda-nos a refletir sobre aquilo
que realmente interessa aos internautas brasileiros.
Em poucas horas, as redes sociais
foram tomadas por imagens e pérolas da idiotice declarada. Centenas de
“compartilhadores” comentavam com absoluto interesse e com riqueza de detalhes
todas as informações que pudessem polemizar ainda mais tudo aquilo que, para
Karina (esse é o nome da garota), era a maior tragédia de sua vida. O gosto
pelo drama alheio parece intrínseco à condição humana, no entanto, o fascínio
pelo escândalo parece resultar de uma falta absurda de bom-senso e caráter. Além
disso, a futilidade do tema aliada a um interesse incomensurável por parte do
público explica todo primitivismo intelectual e moral que impera sobre nós.
Contemporâneo ao episódio
em que a vida de Karina era destruída pelos internautas brasileiros, a
Palestina era dizimada pelas tropas israelenses na Faixa de Gaza, bem como os
índios Guarani-Kaiowás eram mortos e perseguidos pelos latifundiários
brasileiros. No entanto, vimos a raríssimas manifestações referentes a esses
problemas. Por que será? Talvez pelo
fato de nossas opiniões serem as piores possíveis: tendenciosas, parciais e sem
nenhum vestígio de inteligência.
Nossas atenções, em sua
maioria, se voltam para o sensacionalismo barato da televisão, para o escândalo
do estupro, do latrocínio, do sexo explícito. O bombardeio de frivolidades, como
novelas, futebol, programas de auditório que exploram diariamente a miséria de
nosso povo, constrói e nutre personalidades controvertidas, conflitantes em sua
essência. Essa indústria de aberrações que está plenamente estabelecida é um
sinal notório que não sairemos com tanta facilidade dessa escuridão intelectual
a qual nos imergimos.
Por isso, e por outros
infinitos exemplos, o otimismo em relação à condição humana é relativamente
discutível. Para Epicuro, que afirmava que os males que atormentam o espírito
humano podem ser vencidos, resta-nos a descrença quase total em sua assertiva,
deixando, talvez, maior credibilidade para Schopenhauer, que pregava que esse é
o pior dos mundos possíveis e nada pode ser feito a respeito.
Fernando Grecco é articulista político.
www.fergrecco.blogspot.com
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