domingo, 8 de dezembro de 2013

Há 50 anos, plebiscito decidia pelo "sim"

 Notícia publicada na edição de 08/12/13 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 016 do caderno A
 Sabrina Souza









Primeiro de dezembro de 1963. Foi nessa data que um plebiscito decidiu pelo desmembramento de Votorantim, então distrito de Sorocaba. Os ideais da emancipação, no entanto, surgiram bem antes entre os moradores do bairro, que vinham de todos os lugares do País para trabalhar nas fábricas do Grupo Votorantim, num período em que a região gerava grande volume de impostos que não eram revertidos em melhorias para a população. E, apesar do tempo passado, a luta pelo "sim" permanece viva na memória dos vanguardeiros, homens e mulheres que lideraram o movimento da emancipação, apoiados e financiados pelos industriais da época. A partir da década de 50, incontáveis comícios e passeatas mobilizaram a população, que chegava a 17 mil habitantes. Do outro lado, encabeçado pelo então vereador Juvenal de Campos, o grupo do "não" se manifestava contra a divisão.

"A fábrica fornecia tudo, era até cômodo para o governo", comenta o vanguardeiro Antônio Wilson de Campos sobre a principal motivação do movimento da emancipação. Na década de 50, o grupo Votorantim dotou o distrito de infraestrutura que não existia nos outros bairros, oferecendo casas, água, luz, coleta de lixo, escolas, comércio e lazer aos seus funcionários. "Pagávamos apenas um valor simbólico pelo aluguel, e tínhamos inclusive água tratada, que não havia nem em Sorocaba", lembra Antônio. As vilas operárias eram construídas no entorno das três fábricas do grupo, na Barra Funda, Chave e Santa Helena. "É claro que a fábrica tinha interesse em manter os trabalhadores próximos, pois quando precisassem da mão-de-obra deles, eles estariam lá, disponíveis", explica o jornalista César Silva, que em 2011 coordenou um levantamento sobre os vanguardeiros na Prefeitura de Votorantim. E esse era, afirma, o principal argumento do grupo contrário à separação. "A campanha do "não" foi baseada no mote de que a empresa iria baixar os salários", justifica o pesquisador. No ramo têxtil, a indústria Metidieri era responsável pela geração de empregos no distrito, e o seu proprietário, Alfredo Metidieri, também lutou pela emancipação.

Sobrinho do vereador Juvenal de Campos, Antônio relata que os primeiros sinais de que a população estava descontente com a falta de assistência do poder público surgiram já no início da década de 50. "Nessa época, as fábricas propiciavam, juntas, mais de 13 mil empregos", diz. Apesar do parentesco com o líder da oposição, o vanguardeiro participou ativamente da luta pelo "sim", sendo responsável pelas gravuras da campanha. "Morávamos praticamente debaixo do mesmo teto, mas nunca tivemos nenhum tipo de desavença por isso", declara Antônio, que após trabalhar na tecelagem da fábrica de chitas, foi transferido para o setor de fotogravuras. "No início, apenas reproduzíamos as estampas que vinham prontas da sede, até um dia em que um diretor de vendas viu por acaso um desenho meu e pediu para que eu desenhasse para usar nos tecidos", fala.

Foi questão de meses para que o desenhista se tornasse o ilustrador oficial dos vanguardeiros. "As charges ironizavam a situação que enfrentávamos". Antônio desenvolveu, inclusive, dois personagens para representar Votorantim e Sorocaba. "Criei uma moça, que representava a cidade nova e jovem que estava prestes a surgir, e um velho, simbolizando o município ao qual pertencíamos", descreve ele, que lamenta o desaparecimento de grande parte do material que produziu. "Fiz dezenas de gravuras, mas a maioria se perdeu no tempo". Atualmente, parte dos folhetins e tecidos estampados estão expostos no Museu Municipal de Votorantim.

Após intensa campanha pelo desmembramento, o plebiscito ocorreu em 1´ de dezembro de 1963. A vitória do "sim" foi esmagadora: dos 4.181 eleitores, 3.099 optaram pela emancipação, enquanto que o "não" teve 1.003 votos e o restante ficou entre brancos e nulos. Divulgado no dia seguinte, o resultado parou o distrito, lembra Antônio. "Era uma segunda-feira, estávamos trabalhando quando anunciaram a emancipação", relembra. Já o vanguardeiro Ari Pires Martins ressalta que a fábrica liberou os funcionários para comemorar. "A multidão tomou as ruas em plena segunda-feira", conta ele, que fazia parte da banda conhecida como "orgulhosa", composta por cerca de 30 músicos. "Imediatamente fomos acionados para celebrar o desmembramento", diz. Ari, que tocou bombardino durante os comícios e passeatas pela campanha do "sim", afirma que a banda foi o alicerce para sua carreira musical. "Aprendi muita coisa tocando com os vanguardeiros e até hoje me dedico à profissão", afirma aos 74 anos. A oposição, por sua vez, também tinha sua banda, que foi apelidada de "teimosa". "Chamavam assim pela resistência que eles tinham em aceitar que precisávamos ser independentes", destaca.

Primeiro governo

A primeira eleição de Votorantim aconteceu em 1965 e o professor Pedro Augusto Rangel, que já havia sido nomeado subprefeito no período de transição, foi eleito por 60% dos votos. Filha dele, a advogada Eliana Mariza Rangel recorda com carinho o mandato do pai. "O início foi muito difícil e ele levava móveis e material da nossa casa para poder trabalhar", revela. As reuniões, conta, frequentemente aconteciam na própria residência da família, localizada na Barra Funda. "Além disso, os moradores se reuniam em frente à nossa casa para pedirem as coisas", lembra.

Pedro, que como vereador chegou a ser presidente da Câmara Municipal de Sorocaba, cumpriu seus quatro anos de governo, mas não foi reeleito em 1968. "Um fato curioso é que todos os outros prefeitos eleitos eram da oposição", frisa o vanguardeiro Ari Martins. Em 1972, Pedro sofreu um acidente enquanto dirigia pela estrada que levava à fábrica Votocel, asfaltada em seu mandato. Seu carro colidiu com um ônibus durante uma ultrapassagem e ele morreu na hora. Para a filha, restam as lembranças da época em que o pai governou a cidade. "Tenho muito orgulho de tudo que ele conquistou", finaliza. (Supervisão: Armando Rucci Filho)

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