quinta-feira, 3 de julho de 2014

Cortella defende democratização do acesso e da permanência na Educação


 Notícia publicada na edição de 03/07/14 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 012 do caderno A


Filósofo esteve presente em Congresso que acontece em Votorantim
 
 
 Para Cortella, promover mudanças na educação é responsabilidade dos pais, alunos, professores e funcionários - Emídio Marques


Filósofo, escritor, professor, especialista em educação e palestrante conhecido internacionalmente, Mário Sérgio Cortella é dono de um extenso currículo profissional e, na maioria das vezes, dispensa apresentação. Foi assim no 6.º Congresso de Educação de Votorantim, no auditório municipal "Francisco Beranger", onde abriu a programação de três dias a cerca de 270 educadores. Antes de debater sobre "Gestão, currículo e inclusão", Cortella concedeu entrevista ao jornal Cruzeiro do Sul.
Quais os principais desafios educacionais hoje? Quais são nossos instrumentos para enfrentar e superar esses desafios?
A gente tem quatro desafios principais na educação pública brasileira: primeiro deles é a democratização do acesso e da permanência, isto é, aumentar cada vez mais o número de pessoas em qualquer idade na educação básica e tudo aquilo que deveria ser obrigatório, e em segundo lugar não só entrem como permaneçam dentro da escola; o segundo desafio é exatamente a ideia de democratização da gestão, isto é, que as comunidades pedagógicas: pais, alunos, professores e funcionários, tenham presença ativa dentro do equipamento escolar. O terceiro é uma nova qualidade de ensino em relação ao tempo que vivemos com uma modificação das condições de trabalho docente e de formação continuada de modo que a gente faça melhor aquilo que a gente precisa fazer; e em quarto lugar a educação de jovens e adultos. Porque é vergonhoso que um país que é a sexta economia mais poderosa do mundo tenha ainda 14 milhões de homens e mulheres com mais de 15 anos de idade que não sabem ler o lema da própria bandeira. Há dois caminhos para isso: o primeiro deles é maior aporte de recursos financeiros, e isso o Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado vai prover, pela forma como foi colocado, e em segundo lugar a organização da educação como uma questão de natureza de nação e não de governo, isto é, que independa do governo que tiver na gestão de uma cidade, de um estado ou nacional, seja um problema da sociedade e o candidato ou candidata se comprometa com aquele projeto.
A proposta da Educação Continuada tem sido realmente levada a sério pelos professores e gestores educacionais?
Em alguns locais, sim, em outras cidades nem sempre. Há vários lugares em que a educação continuada é a alternativa, em outros aparece eventualmente, como sendo uma organização apenas como uma ironia de condição salarial. Dependerá primeiro do compromisso do gestor público com aquela atividade, e segundo com o modo como ele envolve docentes nessa mesmo atividade. Por isso o compromisso não está ligado apenas a pedir que alguém faça, mas que ele compreenda que aquilo é sério e que seriamente deve ser agido.
Quais os pontos positivos que o senhor ressalta dessa busca contínua (se é que existe) de aprimoramento profissional na área da educação?
É absolutamente impossível não haver esse aprimoramento. Educação lida com vida, e vida é processo, e processo é mudança. Nossos alunos são do século 21, nós docentes somos do século 20 e uma parte dos métodos é do século 19. Por isso ou nós fazemos esse aperfeiçoamento continuado sempre ou nós vamos ter um anacronismo, um ficar fora do tempo em relação a isso. É claro que não depende do docente. Ele precisa ser ajudado, auxiliado e ao mesmo tempo estruturado pelo gestor público dentro dessa área.
Em que aspecto essa proposta ainda tem falhas no processo educacional brasileiro?
Sempre tem. Não existe nenhuma nação que tenha conseguido dar conta de uma educação que seja mais ampla em relação ao atendimento do conjunto das atividades escolares. Porque educação não é só escola. Escola é um pedaço da educação. Se família, governo, sociedade em geral, a mídia não se envolvem nessa questão não se conseguirá de maneira alguma. E entender que a educação é um problema da escola é ter uma visão limitada, parcial e quase que tola em relação ao que é educação de fato.
Há professores/gestores que dizem não ter tempo ou recursos financeiros para se aprimorar. Como avalia essa postura?
Que é uma questão de irresponsabilidade do gestor público, é uma irresponsabilidade do prefeito ou da prefeita quando ele tendo sido eleito argumentando que daria prioridade, por exemplo, como é usual a área da educação depois que assume não o faça de fato. É melhor então não falar e ser eleito a partir daquilo que são os argumentos corretos. Agora dizer que fará num caminho e não o fazer é uma forma de estelionato.
Quem perde mais? O professor/gestor ou o alunado?
Todos perdem. Não existe vitória quando a coisa é ruim na vida social. Não há vencedor. Só há perdedores. Vencem aqueles que são contrários a uma vida coletiva digna, vencem aqueles que são egoístas, vencem aqueles ou aquelas que acham que educação pública possa ser colocada de lado porque não importa. Vencem, portanto, aqueles que são "pedagocidas".
No Brasil, está ocorrendo uma revolução pela educação ou estamos longe de objetivos mais definidos dentro do processo ensino-aprendizagem?
Nós estamos no fim do começo. Não estamos no começo do fim ainda. Nós estamos dando os passos iniciais nos últimos trinta anos. Nos dois governos do Fernando Henrique Cardoso, nos dois do Lula e nesse da Dilma nós começamos a sair da indigência educacional, mas nós estamos apenas no fim do começo. Mas não estamos também naquela situação miserável que estávamos antes.
Então não é para ser pessimista?
De maneira alguma. Teria que ser tolo para ser pessimista. Nós avançamos muito nos últimos trinta anos. Agora não dá para ter uma esperança que acalma, uma esperança que acomoda. Tem que ser uma esperança que vai buscar, que continua, e que sabendo que nós saímos da UTI estamos na enfermaria e não tivemos alta ainda.
A quem atribuir a maior responsabilidade na obtenção de resultados efetivos no processo educacional?
De maneira geral. Se é uma atividade pública na área de educação a comunidade daquela cidade. Não é um problema só do prefeito ou da prefeita. Uma comunidade como um todo que abandona, isto é, que deixa em plano secundário a educação escolar ela é responsável. Em segundo lugar o gestor público, e em terceiro aqueles que estão envolvidos no cotidiano da atividade como professores e funcionários. Mas no ponto de partida é a própria comunidade local que abandona, seja quando vota errado, seja quando após ser votado esquece.
Como avalia as 20 metas do Plano Nacional de Educação (PNE) sancionado no dia 26 de junho pela presidente Dilma?
Elas são necessárias para que a gente tenha uma referência, um horizonte. Uma meta não é algo que coloca a realização como algo absolutamente infalível, mas não tê-las é algo que seria muito ruim. E essas vinte são factíveis, isto é, elas podem ser realizadas se tivermos vontade política e escolha pessoas para a gestão pública comprometidas de fato. Não apenas com a palavra educação, mas que vão fazer com que o país dê um avanço maior ainda.
Essas metas têm realmente condições de serem cumpridas dentro do prazo determinado?
Se nós tivermos uma sociedade que se envolva nelas sem dúvida. Se temos condições de fazer usinas hidrelétricas, de organizar a Copa do Mundo, de organizar uma estrutura de construção de fábricas, é claro que essas metas também o são.
A quem compete ser o protagonista de mudanças efetivas na seara educacional no Brasil?
Toda a comunidade pedagógica: pais, alunos, professores e funcionários. Não existe o protagonismo que seja feito apenas pela atividade docente, ao contrário, ou se envolve o conjunto da comunidade ou isso não ganha força e gera mero discurso.  Congresso encerra-se hoje
"Currículo com arte: inclusão e participação nas políticas públicas educacionais" será o tema da palestra que encerra hoje, no período da manhã, a 6ª edição do 6º Congresso de Educação de Votorantim. O assunto será debatido pelo professor doutor Paulo Roberto Padilha e banda Transbordarte2033. A programação teve início terça-feira, dia 1º de julho, e reúne em torno de 270 educadores de Votorantim, Sorocaba e outras cidades próximas.


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