domingo, 3 de maio de 2015

Prefeitura e Santa Casa são condenadas por troca de bebês

Jornal Cruzeiro do Sul
Wilson Gonçalves Júnior

TJ/SP manteve a decisão em 1ª instância, condenando ambas ao pagamento de uma indenização de R$ 90 mil


Em 2005, a Justiça decidiu que tanto Vitor como Giuliano ficariam com Rita - Erick Pinheiro





Dez anos depois da troca de bebês, ocorrida no Hospital Municipal de Votorantim Lauro Roberto Fogaça, no ano de 2004, a dona de casa Rita Ribeiro da Silva e os filhos Giuliano e Vitor Hugo conseguiram na Justiça o direito a indenização por danos morais e materiais. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP) manteve a decisão em primeira instância, condenando solidariamente a Prefeitura de Votorantim e a Santa Casa de Misericórdia de Votorantim ao pagamento de uma indenização de R$ 90 mil - valor que deverá ser atualizado na execução da sentença - e também de um salário mínimo por mês até que o jovem complete 21 anos de idade. O advogado da família, José Roberto Galvão Certo, já entrou com pedido de execução da sentença na 1ª Vara Cível do Fórum de Votorantim.

O caso ocorreu em 2004, quando a dona de casa Rita Ribeiro da Silva deu a luz ao menino Victor Hugo no dia 19 de julho. Naquela ocasião, o Hospital Municipal Lauro Roberto Fogaça era gerenciado pela Irmandade Santa Casa de Votorantim. No mesmo dia, nasceu Giuliano, filho de Luciana Andrade de Camargo. As duas estavam internadas no mesmo quarto e houve a troca dos bebês.


A desconfiança da troca surgiu para Rita Ribeiro da Silva da pior forma possível, já que Giuliano, o bebê que estava com ela, era branco. Tanto Rita como seu marido, Cláudio Gonçalves Machado - hoje falecido -, são negros. Meses depois do nascimento, fruto da insistência da própria Rita, que surgiu a desconfiança da troca de bebês. A mãe passou a levantar as informações, junto à Santa Casa de Votorantim e a confirmação da troca veio com a realização do DNA. "Foi uma surpresa né. Um hospital pequeno, uma cidade pequena e só duas crianças nasceram no dia e aconteceu a troca. Sempre via passar na televisão esse negócio de troca e comigo achei que nunca ia acontecer. Só que aconteceu e foi um choque", afirmou Rita.

As mães precisaram trocar os filhos e moraram um período juntas, em casa alugada pelo município, para que houvesse uma adaptação. Em 2005, a Justiça decidiu que tanto Vitor como Giuliano ficariam com Rita.

O advogado da família, José Roberto Galvão Certo, disse que o erro de procedimento do hospital gerou um encargo para Rita Ribeiro da Silva, que acabou ficando com os dois filhos. Ele informou que este é um feito inédito na Justiça brasileira, de uma mãe ficar com os dois filhos. Galvão Certo disse que entrou com ação em 2009, época em que o caso já estava quase prescrevendo para os pedidos de danos morais e materiais.

O advogado espera que a Prefeitura de Votorantim comece a pagar imediatamente o valor mensal de um salário mínimo, que deverá ser pago todo o dia 10, a título de danos materiais, até que o filho adotivo complete a maioridade civil. Galvão Certo apontou ainda que o valor retroativo, contando a data da sentença de primeira instância, da juíza Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad, de 29 de junho de 2011, terá que ser pago de uma única vez.

Outro lado

A Prefeitura de Votorantim informou, por meio de nota da assessoria de imprensa, que não vai recorrer da decisão e vai respeitar e cumprir a determinação judicial. A nota informou ainda que o pagamento de indenização será realizado por intermédio de precatório, conforme aponta a Constituição Federal e que ainda não há prazo definido pelo TJ.

O advogado da Santa Casa de Misericórdia de Votorantim, Lázaro de Góes Vieira, explicou que a Prefeitura, que era a tomadora do serviço prestado pela Irmandade, será acionada na Justiça para o pagamento integral do ressarcimento. Ele explicou que a Santa Casa sobrevivia justamente dos recursos recebidos pelo município pela gestão do hospital e que atualmente, desde que deixou de prestar serviço, não tem mais receita. Góes afirmou ainda que a Irmandade também não possui bens que garantam a execução de sua parte da indenização solidária. "A tomadora tem que pagar por eventual credor do prestador", citou. 




De madeira, tristezas e alegrias


A casa de dois cômodos, situada na rua Isabel Côrrea, é revestida de madeira, tristeza e alegrias. Na frente da moradia, Vitor e Giuliano, os inseparáveis, conforme brinca a mãe Rita, jogam bola com um amigo. Giuliano, o mais falante, logo solta: "mais uma entrevista. De onde é?", questiona. A insurgência vem acompanhada de um riso largo, de quem não por escolha, desde bebê, teve que se acostumar a ter a companhia e o acompanhamento da imprensa.

Por sinal, o falante Giuliano, o que não é filho de sangue, é tido pela mãe Rita como o mais carinhoso. Ele, ao ouvir o relato de dona Rita, derrete-se: "O mais carinhoso e amoroso", completou ele, em cima da frase da mãe.

Rita diz ainda que Vitor é mais sossegado e na dele.

A mãe afirmou que foi uma surpresa boa ter recebido a decisão da Justiça de ficar com os dois filhos. Entretanto, os dez anos foram de alegrias e muita superação, diante dos apuros financeiros. Rita possui outros três filhos, além do dois. A tristeza maior para a família veio no final de 2010, com a morte do marido e pai, Cláudio Gonçalves Machado. Ele foi pescar no Rio Sorocaba e morreu afogado. "Depois de todo esse barulho com a troca, veio a morte do pai e a gente não comenta muito. Só que eles sentiram bastante a morte do pai, já que ele era o brincalhão e o que deixava fazer tudo."

Rita também se derrete ao falar dos filhos, principalmente na ligação dos dois, que procuram fazer tudo juntos e são muito amigos. Até na escolha dos times, que divergiram da escolha da mães. Vitor e Giuliano são corintianos, enquanto Rita torce para o Palmeiras. "Eles brigam também e são irmãos né, isso é coisa de irmãos."

A mãe espera ansiosa pelo dinheiro da indenização justamente para poder dar um pouco de conforto para todos os filhos. A primeira medida será comprar uma casa e deixar a residência com dois cômodos e um único banheiro, que é dividido com outra casa que fica no mesmo terreno. "Dez anos se passaram e quase nada na minha vida mudou, em relação a minha moradia. Passei quase 11 anos da minha vida cuidando deles (filhos) sozinha."


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