segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Do nanico ao grande: Fernando Diniz merece respeito

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Marcelo Gomes

Não é de hoje que acompanho a carreira futebolística de Fernando Diniz, novo técnico do São Paulo. Para dizer a verdade, nunca fui muito fã dele como jogador, achava um atacante normal, às vezes meio morto no jeito de falar, às vezes eficiente na hora de marcar gols.

Se fosse dar nota ao atleta, aliás - quem sou eu para dar nota a alguém, mas como o tema é a vida esportiva dele - como atacante, daria um 6,3.

E como dizem os sábios, o mundo dá voltas. A gente, da crônica esportiva, é sempre cheio de avaliar as pessoas, mesmo de longe com o microfone, caneta ou computador nas mãos. Geralmente, os equívocos prevalecem, mesmo que a maioria dos companheiros de profissão nunca assumam os eventuais erros ou até mesmo algumas análises desumanas e até - por que não? - covardes.

Falo isso porque, muitas vezes me sinto incomodado, como jornalista, em ver companheiros de profissão que nunca vão a um treino e quase nunca pegam o telefone para falar com os entrevistados ou com as fontes para escrever sobre os personagens, seja para elogiá-los ou criticá-los. A impressão que dá, muitas vezes, é que o cronista esportivo descasca a lenha no personagem quando está longe dele e alisa quando está em um embate cara a cara.

Sabe aquele moleque folgado, cheio de razão que só esbraveja à distância? Pois é assim que muitas vejo as análises de companheiros que se sentem os deuses ou os donos da bola em suas cadeiras, ou sofás confortáveis nos estúdios da vida, confortavelmente à frente das câmeras com uma bela temperatura do ar condicionado. Escrevo isso porque acredito que o jornalista, independentemente da área que atua, tem que se manter com o olhar e a atitude de repórter. Tem que estar lá pra ver, sentir, ouvir e depois analisar.Fernando Diniz (à direita) durante treino do São Paulo Divulgação

Esse desabafo, em forma de crônica, é na verdade um anseio que há tempos queria publicar, mas não via muito espaço ou gancho para escrever a respeito. Minha inspiração se chama Fernando Diniz, o técnico que conheci no início de 2010, quando ele estreava na profissão, no comando de um time que não merecia a sua credibilidade. O Votoraty, de Votorantim, uma cidade colada à grande Sorocaba, no interior de São Paulo.

Ali, assistindo ao treino da modesta equipe que enfrentaria o poderoso Grêmio, na Copa do Brasil, conferi de perto o trabalho de um profissional que anos mais tarde surgiria, no também modesto Osasco Audax, como uma das revelações do futebol brasileiro.

O curioso dessa história é que nunca fui amigo dele, nem de outros astros do futebol brasileiro. Meus amigos do esporte geralmente são aqueles que não estão nos holofotes da mídia. Como exemplo deixo aqui alguns que fiz amizade, só depois que eles saíram de cena, como o ex-atacante Adil e o ex-goleiro (já falecido) Solitinho. Com Diniz, adquiri respeito e uma certa aversão dos companheiros de redação que, desde quando ele assumiu o Athletico Paranaense o chamavam de maluco, fraco, enfim, que desdenhavam do trabalho e da capacidade dele sem mesmo ter olhado um treino ou ter conversado com pessoas que participaram da carreira dele como treinador.




Neste ano de 2019, eu e o repórter Rafael Valente realizamos uma série de reportagens no Osasco Audax, inclusive com o dono do time, o “Seu” Mário Teixeira, que nos presenteou com uma entrevista inédita, pois o patrão do time nunca havia gravado com ninguém.

Com todos os funcionário que conversamos do Audax, todos falaram com brilhos nos olhos e gratidão a respeito do trabalho e do legado que Fernando Diniz deixou no clube de Osasco, inclusive nos métodos de treino e jogo que são a base de todas as categorias até o profissional.

Marquinhos, um preparador físico que trabalhou com Diniz e que hoje trabalha no mundo árabe, recentemente me disse em um encontro que tivemos num restaurante em São Paulo: “O dia que descobrirem a capacidade do Fernando, ele será um grande treinador mundial. Certeza de que, com a capacidade que ele tem de olhar e desenvolver o futebol, um dia ele treinará um grande clube da Europa”, disparou Marquinhos, que tentou a vida como jogador.

Marquinhos foi lançado com Vampeta no Vitória, mas devido à uma grave contusão abandonou a carreira como jogador, foi estudar e hoje tenta a vida entre treinador e preparador físico.Fernando Diniz Getty Images
O novo assusta

Se o mundo em geral evolui, no nosso querido jornalismo, o que vejo e o que sinto é que a cada dia que passa damos passos largos em direção ao retrocesso. Vivemos tempos de conservadorismo total e de um preconceito latente que bate à porta de uma nova geração que está se formando. Isso é o que se pode falar do novo que Fernando Diniz vem trazendo ao futebol.

Estamos acostumados com as velhas receitas de bolo, e tudo aquilo que foge à regra é feio, desprezível e inaceitável.

Aqui mesmo na redação, muitas vezes vi amigos falando do Diniz como se fosse um aventureiro, um ET muito louco no meio do universo da bola.

Está certo que, depois da passagem dele no clube paranaense, muita gente mudou de ideia e começou a vê-lo com um pouco mais de respeito. Mesmo assim, as críticas ou aqueles comentários maldosos, vira e mexe são destilados, ou em programas de debates, ou em textos de jornalistas que acreditam estarem acima do bem e do mal. Na reportagem acima, resgatamos o início da carreira como o técnico do Votoraty.

Clicando aqui, você pode assistir a fantástica entrevista que ele deu ao Bola da Vez no dia 13 de julho deste ano.

Ali eu, você, o amigo jornalista esportivo e todo fã de esporte terá a chance de conhecer um pouco da vida dele, o que ele pensa para o futebol e como ele olha para o jogador que, além de atleta, também é um cidadão.

Que a sorte grande o ajude nesse novo desafio, talvez, o maior da vida dele como técnico à frente de um clube gigante como é o São Paulo. Que o jogador, o torcedor e o dirigente sejam inteligentes a ponto de abraçar a ousadia desse cidadão que não caiu no futebol de paraquedas. Que respeitem, não só o Fernando Diniz, mas a todos que pensam na evolução do esporte, do atleta e do espetáculo como um todo.



Fico por aqui com um pedido de desculpas aos amigos jornalistas que, de uma forma ou outra se sentiram incomodados com o meu desabafo e, principalmente ao novo técnico do São Paulo, que irá estrear contra o Flamengo, neste sábado. Para que Diniz vire o jogo de uma vez e que adquira, mesmo que seja a fórceps, o tão desejado respeito.

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