Marcel Scinocca
Cidades da Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) convivem com um festival de obras voltadas ao atendimento na área da saúde pública que até agora não foram revertidas em benefícios à população. O Cruzeiro do Sul esteve em Araçoiaba da Serra, Iperó, Votorantim, São Roque e Itu e mostra como foram aplicados mais de R$ 4 milhões em recursos que saíram do bolso do contribuinte. São obras que estão paradas e, em alguns casos, abandonadas. Em outros, estão fora do cronograma de entrega ou ainda estão finalizadas, mas não atendem ninguém. Nem Sorocaba escapou da lista, onde há ao menos um prédio todo reformado, mas sem qualquer atendimento.
Iperó
Nossa primeira parada é em Iperó, mais especificamente no bairro Campos Vileta, na região de George Oeterer. O bairro vizinho a Sorocaba tem cerca de dez mil habitantes e conta com um posto de saúde, que segundo os moradores, está "capenga". Poderia ser diferente se a unidade básica de saúde já estivesse funcionando. A UBS "Cacilda Fogaça de Almeida", construída na principal via do bairro, terá capacidade para atender até 270 pessoas por dia. Terá, porque até agora não atendeu ninguém.
O local deveria ter sido entregue em 2015. Ficou abandonado por vários motivos e durante esse intervalo, até cavalo foi visto dentro da unidade. Quem não pode contar com serviços e precisa se deslocar para outro bairro ou cidade para ter atendimento, reclama. "Entregar que é bom nada. É só enrolação", comenta a cuidadora de idosos Genilda Bezerra da Paz. "Até quando que a gente vai ter que esperar?", questiona a cozinheira Urânia Rocha de Sousa.
A Prefeitura de Iperó afirma que após a visita técnica do Departamento Regional de Saúde de Sorocaba (DRS), em abril deste ano, houve apontamentos relacionados ao piso da unidade e foi preciso fazer adequações. "Esses ajustes foram concluídos recentemente e atualmente falta a instalação dos móveis e equipamentos", diz o Executivo. Com a obra e a compra de equipamentos e o mobiliário, a Prefeitura de Iperó já gastou mais R$ 820 mil no empreendimento.
Araçoiaba da Serra
Seguimos viagem e o problema dessa vez é em Araçoiaba da Serra. A unidade básica de saúde Morro de Araçoiaba está praticamente concluída. Há piso, portas e janelas instaladas, mas nem sinal de médicos e pacientes. O mato alto sinaliza o abandono, as portas abertas um convite aos vândalos. O terreno onde fica o prédio só não está com mais vegetação porque um incêndio consumiu parte do verde da área. Latas de tinta demonstram que a obra não é velha e a falta de poste e cabeamento mostra que a unidade não abrirá nos próximos dias. "É uma obra importante, mas é dinheiro público desperdiçado até agora", opina o comerciante Luís Guilherme, que mora no bairro.
A Prefeitura da cidade afirmou que em vistoria realizada em janeiro de 2017, pelos técnicos da Secretaria de Obras da Prefeitura de Araçoiaba da Serra, ficou constatado que a obra da UBS do Morro não foi concluída, "diferente do que atestou a gestão anterior no Sistema de Monitoramento de Obras da saúde -- Sismob do Ministério da Saúde." Ainda conforme a Prefeitura de Araçoiaba da Serra, a situação motivou uma ação civil pública e uma representação criminal ao Ministério Público contra os antigos gestores. "Já existe reserva no orçamento do município para que a obra, de fato, possa ser concluída. A previsão é para que as obras necessárias no prédio sejam iniciadas até o fim deste semestre", diz o Executivo da cidade sem informar o valor da obra e a estimativa de conclusão.
Votorantim
Em Votorantim, além da polêmica envolvendo as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) (leia mais na página 7), os moradores do Jardim Tatiana poderiam ser atendidos no prédio do posto do Programa Saúde da Família. Poderiam, mas a realidade atual deles é outra. Tapumes em um terreno na rua Adão Martins denunciam que a obra está em andamento neste momento. Uma placa sobre a retomada confirma a situação, mas nem sempre foi assim, tanto que a construção deveria ter sido concluída em 2016.
Segundo a Prefeitura de Votorantim, desde 2014, duas empresas foram contratadas para a construção da unidade, porém ambas abandonaram as obras e os contratos foram cancelados. Os serviços foram retomados no dia 21 de fevereiro deste ano. O custo para a conclusão da unidade é de R$ 108.924,51. O valor contratual é de R$ 286.818,07 e a previsão de entrega da obra é para o segundo semestre deste ano. Alguns moradores botam fé que a obra será, de fato, concluída e explicam os motivos. "Olha, ano de eleição, então, quem sabe dessa vez vai", afirma a autônoma Vanessa Camargo.
São Roque
As obras paradas ou abandonadas seguem. Desta vez, em São Roque. Os moradores foram "contemplados" não com uma, mas com duas obras nessas condições. As UBSs dos bairros Guaçu e Taboão deveriam ser entregues em 2016, mas até agora, só paredes levantadas, mato e muita expectativa. "É uma sacanagem. Precisa terminar essa obra. Quem necessita de atendimento precisa ir para o centro", comenta o motorista José Ivo Izidoro.
As duas obras devem consumir mais de R$ 2,1 milhões e, ao menos neste momento, nem sinal de que elas vão evoluir. Andréa Rodrigues, diretora do Departamento de Saúde da Estância Turística de São Roque afirmou na sexta-feira (27), sem detalhar, que ambas as obras estão em processo jurídico para que possam ser retomadas.
Sorocaba
A placa novinha na entrada do prédio diz que no local há "saúde mais perto de você", "saúde da mulher" e "saúde não tem preço". O local vazio, com cadeado e com um veículo comum na vaga reservada para ambulância mostra que a situação é bem diferente. Dessa vez é Sorocaba que apresenta uma unidade de saúde fechada e que não está servindo à população. Trata-se do prédio em que até 2016 funcionava a unidade de saúde do Lopes de Oliveira.
O prédio recém reformado fica na avenida Riusaku Kanizawa, pertinho da casa da família da dona Elizabete Silva. Mas quando precisa de atendimento médico, ela precisa caminhar muito até o jardim Rodrigo, onde há uma UBS em funcionamento. "Um prédio do lado de casa e temos que ir longe para uma simples consulta", fala. "Gastou para construir, mas está sem utilidade nenhuma", ressalta o marido, Vander Diogenes Pereira.
Também morador da Vila Helena, o aposentado Nivaldo Brás da Silva passa por atendimento médico uma vez por mês. A esposa, Neusa Aparecida Oliveira, também faz tratamento uma vez a cada 60 dias, ambos em outro bairro. "Era bom para a gente que funcionasse aqui. O Rodrigo é longe", lamenta.
A Secretaria de Saúde de Sorocaba informou que a unidade do bairro Lopes de Oliveira foi fechada para reforma e que a obra foi finalizada no dia 26 de março de 2018 e a UBS será reaberta assim que o déficit de funcionários seja suprido com o projeto de reestruturação da saúde e fortalecimento da rede de atenção básica. Os servidores que atuavam nesta unidade forma deslocados à UBS Rodrigo. O total gasto com a reforma foi de R$338.624,50.
Itu
Se os moradores das últimas cidades acham que essas obras paradas e abandonadas representam um exagero, imagina para quem mora em Itu, a terra dos exageros. Na cidade, o problema está relacionado à construção da UBS da Vila Dona Tonica, na região da Vila Progresso. A obra começou em 2015 e foi interrompida na sequência. Foram investidos no local cerca de R$ 500 mil. A estimativa é que ainda sejam gastos mais R$ 300 mil para a conclusão.
Quem mora no bairro não gosta de ideia de ir para outro lugar para receber algum atendimento. "A situação é péssima. Quando esse funcionar será melhor. A cidade está crescendo de qualquer jeito, sem infraestrutura", opina Janaína Barbosa Dias. Os moradores ainda relatam outros problemas. "A empreiteira que pegou a obra não terminou e foi embora, nem pagou os funcionários", diz Vera Lúcia Ferraz, moradora do bairro. Segundo ela, seu marido foi um dos trabalhadores que não recebeu. "Os pedreiros daí estão trabalhando lá no hospital", relata a copeira.
A Prefeitura de Itu não comentou a questão até o fechamento desta edição. Vale ressaltar que no local não há placa que indique o valor da obra, prazo de conclusão e nem de onde vem o recurso para o empreendimento.
Segundo o Ministério da Saúde, em todo o Brasil são 964 Unidades Básicas de Saúde (UBSs) concluídas mas sem funcionamento.



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